sexta-feira, 1 de dezembro de 2006

DIMENSÕES



A realidade tem várias camadas e cada uma delas as suas dimensões. Nós habitamos num T4 dimensional: ao comprimento, largura e altura cartesianos acrescentou Einstein o tempo. Que muitos arquitectos e engenheiros têm em pouca consideração, pois fazem as coisas de tal modo acanhadas, que, passado pouco tempo, ninguém cabe nelas. Vejam-se as ruas da Cidade e os Itinerários Principais que, não tendo sido feitos com a dimensão do tempo, mais se parecem, poucos anos volvidos, com quelhos apertados e estradas de segunda. Mas o estranho é que, à medida que caminhamos para o infinitamente pequeno, mais dimensões são necessárias. O infinitamente pequeno vive em tal irrequietude, incerteza e ubiquidade que precisa, dizem os físicos das partículas e os modelos matemáticos, não de quatro, mas, imagine-se, de onze dimensões! Já imaginaram um electrão a habitar um T11? Cabe lá uma criança numa casa! Uma criança só cabe na rua! O quantum, seja de espaço, de tempo, de matéria, de energia é o que faz a diferença entre 0 ou 1, entre tudo ou nada.

Mas voltemos ao nosso mundo, à nossa condição e dimensão humanos. Se o tempo cósmico é só um, no mundo humano, há dois tempos: o tempo da nossa vida e o tempo histórico. Na carruagem da História há, independentemente da economia e da classe em que se viaja, duas classes e dois tipos de passageiros: os que perguntam pelos horários dos Caminhos de Ferro da História e os que sabem de cor e salteado, e por aqui ficam, os horários dos caminhos da sua vida. A Linha do Douro, para muitos, começa e acaba entre os apeadeiros em que se movimenta o seu existir. Não há cais nem portos, não há Barcas de Alva nem S. Bentos. Felizes os que, ao som da concertina, vão nas mãos do maquinista do Destino, como se levados pela mão por um Deus! Quem vai nas mãos do Destino bem vai. Bem pior está aquele que o perdeu. Apesar de todos termos tomado o comboio da vida no mesmo Entroncamento da História, os bilhetes, os horários e o destino de cada um são bem diferentes. Desculpe, quantos anos tem? Os anos do Universo e da vida. Como?! E você? Sessenta, feitos. Ninguém lhos dá. Para a maioria, a vida decorre consciente no plano individual, mas inconsciente, no plano histórico-civilizacional. Fora da sua vida e do seu contexto, nada mais há. Civilizacionalmente, a maioria vive no presente. Não há passado nem futuro, para além deles. Esta maneira de estar na vida assemelha-se, em muito, à criança, para a qual a vida é um eterno presente. Esta a chave da felicidade da criança. Aquela a chave da felicidade dos adultos. Mais do que este ou aquele regime político, mais do que com liberdade ou sem ela, o que torna a Civilização e a História possíveis é esta inconsciência feliz. Há duas coisas que nos fazem destemidos: a ignorância e a inconsciência. E quando multiplicadas por multidões fazem exércitos imparáveis.

Epocalmente, contemporâneos, civilizacionalmente, extemporâneos. Qual o seu apeadeiro? Alfarelos! E qual o seu destino? Perdi-o, como quem perde o comboio.