quinta-feira, 18 de janeiro de 2007

JOSÉ SÓCRATES: LE PS C’EST MOI

Sócrates é vaidoso e teimoso, dizem. Não é preciso dizê-lo: vê-se. E se a teimosia dá prioridade à vontade sobre a razão, a vaidade é, por norma, feminina. E se, no feminino, ela é espelho, no masculino, o vaidoso é espelho. Quem vê Sócrates, ouve-o baixinho: eu sou o maior e melhor, o top da política, o top dos tops. Sócrates é-se importante. Quando cumprimenta, não estende o braço, estica-o. O cumprimento de Sócrates não é próximo, mas alto e altivo, distante e importante. Anda como quem tem calos. Destes, da vaidade, por não caber nos sapatos, ou por todos os dias serem novos? E se a vaidade, no feminino, maquilha o rosto, nos políticos, manifesta-se através de uma política maquilhada pelo marketing e pelos media.

Sócrates faz tudo para esquecer as circunstâncias que lhe deram a maioria absoluta para mais facilmente se crer absoluto. Sócrates é o “nosso” Luís XIV socialista: L´État c’est moi, le PS c’est moi! Sócrates, porque inseguro, precisa do absolutismo: acabou com a concorrência do PSD metamorfoseando-se nele, acabou com a Comissão Permanente do PS e tornou-se senhor absoluto dentro do PS, decretou a lei da rolha no governo e aos deputados e cronistas incómodos oferece-lhes lugares cómodos. E estes não se fazem rogados. O povo gosta (por enquanto) dele: se gostou de Salazar, de Cavaco por que não há-de gostar de Sócrates? Não são as dificuldades e a falta de pão que abrem as portas aos poderes absolutos? O povo sente-se seguro com estes homens. Sócrates é mando e não comando, arrogância e não firmeza, agressão e não convicção. Sócrates é mandante, não comandante. Sem maiorias absolutas, Sócrates dificilmente conseguirá, tal como Cavaco, governar. O PS não faz diferença do PSD, seja no conteúdo seja na forma. No conteúdo, o PS de Sócrates é o PSD que a direita nunca tinha tido. Na forma, o PS é o líder: sem ideias, sem ideais, sem correntes de pensamento, sem soaristas, sem guterristas, sem ferristas, sem oposição, com excepção dos alegristas, sem fio de pensamento, sem uma gota de utopia. Um bafio. Uma secura à e para a esquerda. Uma fartura, à e para a direita. Sócrates aprendeu com a direita e esqueceu (se alguma vez soube alguma coisa dela) a esquerda. Nem o PS é já um partido nem Sócrates um político: o governo do PS, perdão de Sócrates, é a gerência do País e Sócrates o gerente da firma em que ele está transformado. Mais do que um gerente ou um executivo, Sócrates lembra um “standista” a quem temos que lhe agradecer a venda do carro, o nosso despedimento ou a transferência da empresa para outro lado. E, caso fosse economicamente vantajoso, Sócrates não pensava duas vezes: transferia o País para norte ou para sul, para leste ou para oeste. Sócrates não ora, ralha e, claro, não discursa, pois para isso é preciso fazê-los. Sócrates lê-os. Autor? Para seu resguardo, segredo.

Sócrates, como os canais generalistas, é generalista e as suas generalidades, ditas com ar de mando, são as responsáveis pelo seu share político. A força de Sócrates assenta na fraqueza e fragilidade económicas que vivemos e de que o “centrão” é o único e verdadeiro responsável. «Pobre do governo! Isto está tão mal!» Sócrates vai sair pela porta que abriu: pela direita. Mas, desta vez, não vai haver tempo para folgarmos as costas: à prática política de direita de Sócrates vai suceder a prática política de direita da direita. A Cavaco sucedeu Guterres, mas a Sócrates vai suceder Sócrates ou um Sócrates para pior. À direita vai suceder mais direita. Sócrates mandou a política, pela rua da direita, ladeira abaixo e vai ser difícil parar a sua inércia. E, quando for preciso sustê-la, Sócrates não vai estar lá.