quarta-feira, 14 de março de 2007
«A poda é a arte e a técnica de orientar e educar as plantas,
de modo compatível com o fim que se tem em vista».
[SIMÃO, S., Tratado de Fruticultura. Piracicaba: FEALQ, 1998.]
de modo compatível com o fim que se tem em vista».
[SIMÃO, S., Tratado de Fruticultura. Piracicaba: FEALQ, 1998.]
É altura da poda seca. Deve-se o tema desta crónica a eu ter passado parte do fim-de-semana a podar o damasqueiro e a videira que, mais do que uvas, faz uma frondosa latada no verão, onde faço a minha sala de jantar. Seguindo a epígrafe, que encabeça o texto, podei o damasqueiro em forma de vaso, conforme meu pai me ensinou, forma que é utilizada para oliveiras, amendoeiras e outras árvores de fruta, pois tem duas vantagens: a planta respira melhor e, por outro, a recolha dos frutos é facilitada; a ramada podo-a seguindo e segundo este princípio: desenho uma coluna vertebral de onde nascem regular e alternadamente costelas com dois olhos de onde verde e pampos brotarão. Frutos? Se o damasqueiro é irregular, tendo anos em que carrega bem e outros em que damascos nem vê-los, a ramada não recebe o sol suficiente e a casta não é a melhor indicada para o local, mas é coisa que não me aborrece por aí além, pois o mais importante é o espaço verde, aprazível e fresco, para não dizer religioso, que a latada faz, lembrando um templo pagão do frígio deus.
Agora, peço-lhes para fazerem o exercício que eu fiz: leiam a citação que encabeça o texto e substituam a poda por educação e as plantas por pessoas (crianças, adultos, professores e alunos, ministros e ministras). Que dizem? E, quando leio os diferentes tipos de poda – poda de formação, de frutificação (as podas de rejuvenescimento, regeneração e tratamento estão ainda a dar os primeiros passos com a biotecnologia e as operações plásticas) –, mais a semelhança entre árvores e nós me aparece familiar, verdadeira e saborosa! Assim como a árvore frutifica em função do modo como é formada, assim nós frutificamos em função da cepa (dos genes) e do modo como somos formados pela educação familiar, social e escolar. Se a poda aumenta o vigor, porque não desperdiça energias em mamões e ramos sem utilidade; se o tronco aumenta na proporção inversa da poda; a educação, do mesmo modo, orienta a energia para o nosso crescimento e desenvolvimento e, em lugar de obesidade mental e corporal, torna-nos elegantes física e espiritualmente – «alma sã em corpo são». A educação não deixa de ser uma espécie de poda: corta o que impede e desvia o desenvolvimento e orienta e potencia a seiva que nos faz. E como nos falta o princípio pedagógico que a citação refere – «de modo compatível com o fim que se tem em vista» – e não metendo todas as espécies e pessoas na forma da poda única. Uma poda errada, na natureza, destrói a árvore; na vida e na escola, gera insatisfação, distúrbios e insucesso. Quem hoje percebe da poda? Não seria importante que pais, professores, ministros e ministras de educação tirassem um curso de poda? E quem hoje quer ser podado? Não é mais fácil andar à solta?
Estamos sem cultivo: naturalmente, tudo abandonado e sem agri-cultura, humanamente, a iliteracia, a escola para todos, mas para ninguém, e o abandono. À falta de uma formação exigente de podadores (a começar pelos formadores!), à falta de exigência para podadores e podados, à falta de cultura que tenha em conta a cepa de cada um, à falta de saber dos feitores que passam pelos ministérios, como se quinta deles fosse, somos cada vez mais um mata espessa sem fruto nem baga, que amanhã alimentará incêndios sociais. Não somos um país, somos um matagal.
quinta-feira, 8 de março de 2007
Escrevemos, aquando da demissão de Portas da presidência do partido, após a derrota do PSD e do CDS nas últimas legislativos, que Portas só voltaria à política para voos mais altos. No plano das intenções, assim parece acontecer. Depois da fase do luto, que ele não cumpriu, mas entregou a outros – foi a Ribeiro e Castro como podia ter sido a Telmo Correia ou a outro – ei-lo de volta, apesar de nunca verdadeiramente ter saído: se, partidariamente, calado (na Assembleia da República, nem piou), politicamente, continuou palavroso, graças às portas que a SIC Notícias lhe abriu, como comentador, no programa Estado da Arte, mas não com o sucesso esperado pelo canal e pelo comentador.
Então, o que traz Portas de volta? Se a agonia do CDS é o motivo, não é a razão: Portas não quer desperdiçar a porta aberta pela ausência de oposição à direita. E por ela quer entrar como candidato a líder de direita e da direita. Da direita, principalmente. Ele o disse: é preciso oposição do centro-direita a Sócrates e um líder que faça oposição. Como Portas, se pudesse, daria o salto do CDS para o PSD! Contudo, é precisamente este o salto que pretende dar, mas sob uma outra forma. E por que não tentar, se no circo da política a acrobacia não implica perigo, porque as quedas são amortecidas pela rede da memória curta? Apesar da táctica e do incentivo, que lhe foram dados por quem eu nunca esperava (Pulido Valente) – Portas, se for «subversivo» e não «populista, poderá vir a ser o líder da direita –, o objectivo não só é difícil de atingir como nos parece mais filho da fantasia do que de análise fria. E por várias razões: (i) como já escrevemos, a ausência de oposição, de direita, não reside em saber ou não saber fazer oposição, mas no facto de o PS de Sócrates ter ocupado o espaço de centro-direita e para o comprovar basta ver o apoio que este governo tem dos media, em geral; e sabendo nós quem eles representam, não vão, de certo, trocar Sócrates por Portas, se não trocam Sócrates por Marques Mendes (o pouco destaque que o DN e o Público lhe deram – este remeteu-o para a sexta página, sem qualquer referência na primeira – diz muito); neste momento, quem melhor serve política e economicamente os interesses do centro-direita é o executivo de Sócrates; (ii) assim, a revolução que Portas pode trazer não é de conteúdo, mas de forma; como pode criticar as políticas de Sócrates, se elas são de direita? Formalmente, sim, pois Marques Mendes, amordaçado pelas políticas de centro-direita de Sócrates, não tem sido nem formal nem materialmente oposição visível; (iii) contudo, a reentrada em cena de Portas, e principalmente com esta agenda política em mente, não vai deixar o PSD quieto e mudo (Marques Mendes que se mexa e cuide); e, se Portas tiver algum sucesso, bem poderá obrigar o PSD a fazer um congresso extraordinário e a encontrar um novo líder (ou uma líder, não estão as mulheres na moda?), que torne, pelo menos, o PSD visível, caso não caia no suicídio de entregar o PSD nas mãos de Menezes, e a não ficar à espera que a cicuta do poder “mate” Sócrates.
O golpe de Sócrates foi governar à bloco central, sem precisar de alianças com o PSD. A oposição só pode vir do PCP, do BE e do interior do PS, porque acabou com a de direita, só que o PS é o seu líder e o aparelho, salvo duas ou três excepções, trocou as referências ideológicas pelo poder. Como quer Portas ser o político da direita, se, além de ter de se substituir ao PSD, a direita está com Sócrates, embora com o cartão do PSD, no bolso e, se calhar, com as cotas em atraso? Mais de que cumprir uma missão impossível, Portas parece cumprir, uma vez mais, a sua missão: agitar. Portas é o hiper-activo da “nossa” política. E, no morno em que isto está, tem mais a ganhar do que a perder. E que vai enervar Sócrates e tudo fazer para que ele perca a cabeça, vai.
Então, o que traz Portas de volta? Se a agonia do CDS é o motivo, não é a razão: Portas não quer desperdiçar a porta aberta pela ausência de oposição à direita. E por ela quer entrar como candidato a líder de direita e da direita. Da direita, principalmente. Ele o disse: é preciso oposição do centro-direita a Sócrates e um líder que faça oposição. Como Portas, se pudesse, daria o salto do CDS para o PSD! Contudo, é precisamente este o salto que pretende dar, mas sob uma outra forma. E por que não tentar, se no circo da política a acrobacia não implica perigo, porque as quedas são amortecidas pela rede da memória curta? Apesar da táctica e do incentivo, que lhe foram dados por quem eu nunca esperava (Pulido Valente) – Portas, se for «subversivo» e não «populista, poderá vir a ser o líder da direita –, o objectivo não só é difícil de atingir como nos parece mais filho da fantasia do que de análise fria. E por várias razões: (i) como já escrevemos, a ausência de oposição, de direita, não reside em saber ou não saber fazer oposição, mas no facto de o PS de Sócrates ter ocupado o espaço de centro-direita e para o comprovar basta ver o apoio que este governo tem dos media, em geral; e sabendo nós quem eles representam, não vão, de certo, trocar Sócrates por Portas, se não trocam Sócrates por Marques Mendes (o pouco destaque que o DN e o Público lhe deram – este remeteu-o para a sexta página, sem qualquer referência na primeira – diz muito); neste momento, quem melhor serve política e economicamente os interesses do centro-direita é o executivo de Sócrates; (ii) assim, a revolução que Portas pode trazer não é de conteúdo, mas de forma; como pode criticar as políticas de Sócrates, se elas são de direita? Formalmente, sim, pois Marques Mendes, amordaçado pelas políticas de centro-direita de Sócrates, não tem sido nem formal nem materialmente oposição visível; (iii) contudo, a reentrada em cena de Portas, e principalmente com esta agenda política em mente, não vai deixar o PSD quieto e mudo (Marques Mendes que se mexa e cuide); e, se Portas tiver algum sucesso, bem poderá obrigar o PSD a fazer um congresso extraordinário e a encontrar um novo líder (ou uma líder, não estão as mulheres na moda?), que torne, pelo menos, o PSD visível, caso não caia no suicídio de entregar o PSD nas mãos de Menezes, e a não ficar à espera que a cicuta do poder “mate” Sócrates.
O golpe de Sócrates foi governar à bloco central, sem precisar de alianças com o PSD. A oposição só pode vir do PCP, do BE e do interior do PS, porque acabou com a de direita, só que o PS é o seu líder e o aparelho, salvo duas ou três excepções, trocou as referências ideológicas pelo poder. Como quer Portas ser o político da direita, se, além de ter de se substituir ao PSD, a direita está com Sócrates, embora com o cartão do PSD, no bolso e, se calhar, com as cotas em atraso? Mais de que cumprir uma missão impossível, Portas parece cumprir, uma vez mais, a sua missão: agitar. Portas é o hiper-activo da “nossa” política. E, no morno em que isto está, tem mais a ganhar do que a perder. E que vai enervar Sócrates e tudo fazer para que ele perca a cabeça, vai.
sexta-feira, 2 de março de 2007
Sócrates não desarma: depois de, nas Jornadas Parlamentares, ter proclamado o PS de partido «progressista» (a necessidade de o dizer não reflectirá a ausência de o ser?), pelo contributo que deu para a despenalização do aborto até às dez semanas, não tardou, receoso que a ideia fecundasse, a fazê-la abortar com a política «do dia seguinte» de direita.
Após a vitória do sim no referendo sobre a despenalização do aborto, houve dois acontecimentos, que passaram despercebidos (?), que eu saiba, à grande imprensa, aos seus comentadores e colunistas residentes e que passo a referir: (i) José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa, nas Jornadas Parlamentares do PS, deixou, porque sem ponto, que o seu inconsciente falasse livremente e sem freio: ...caros camaradas, agora, quero dizer-vos «do fundo do meu coração» que «talvez» não tenha vivido uma noite como a de domingo (noite do referendo) e pensei que o PS bem merecia ser classificado de partido «progressista»! Talvez? Como esta frase, principalmente a palavra «progressista», é, psicológica e psicanaliticamente, a «chave» para “entrar” em Sócrates. Fiquemos pelo essencial: José Pinto de Sousa, primeiro-ministro, ao adjectivar o PS de «progressista» (categoria política fundamental da terminologia política de esquerda), pela adesão à causa da despenalização do aborto, demonstrou, sem querer, o seguinte – aquele que é, há dois anos, o primeiro responsável pelo ataque ao Estado Providência, aproveitando o fantasma do défice, é o mesmo que se regozija do «fundo do coração» de o PS ser um partido “progressista” num fim de semana! Como ele se sentiu feliz por ser socialista (a sério ou a fingir?) naquela noite, depois de um jejum socialista de dois anos de governação! Ao tentar ocultar a prática política de centro-direita do seu governo mais a reconheceu. Quererá ele, à semelhança do seu ministro da saúde convidar-nos para entrar para a caravana que quer varrer urgência como varreu maternidades e a gratuitidade do sistema nacional de saúde? (ii) quando li no Público virtual (12-2-07), mas que não vi no impresso (!) o seguinte – «A Federação Nacional dos Professores (Fenprof) classificou hoje de ilegal a proposta da tutela referente ao primeiro concurso para professor titular, alegando que o critério da assiduidade discrimina os docentes que estiveram doentes ou de licença de maternidade (sublinhado, nosso). Segundo a proposta do Ministério da Educação (ME), o processo de selecção para a categoria de titular, a mais elevada da nova carreira, vai ter em conta todas as faltas, licenças e dispensas dos candidatos entre os anos lectivos 2000/01 e 2005/06, mesmo que tenham sido dadas por doença ou maternidade (sublinhado, nosso), por exemplo» – não queria acreditar!
O PS “progressista” de José Sócrates Pinto de Sousa que se bateu pela IVG no dia 11 de Fevereiro é o mesmo que, «no dia seguinte», penaliza a maternidade: a licença de maternidade é considerada falta e descrimina as mulheres que foram mães, para o acesso a professor titular. Aos tradicionais métodos de contracepção o PS “progressista” do engenheiro, pela Universidade Independente, José Sócrates junta a medida “progressista” de punir as mulheres que tenham filhos, sendo o tempo de licença de maternidade considerada como faltas dadas!
Post scriptum. Leio, em destaque na primeira página, num diário: «Despedimentos de grávidas não param de aumentar». Onde está o «sim» à vida e o partido “progressista” de Sócrates? Como o «dia seguinte» é terrível!
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