sexta-feira, 8 de dezembro de 2006

NÃO HÁ SEGOR PARA ONDE IR


Face à impiedade dos habitantes de Sodoma e Gomorra, o deus de Abraão confidenciou ao patriarca a sua decisão de as condenar, a elas e aos seus habitantes, à extinção e morte pelo fogo. Abraão, mais humano do que o seu deus, retorquiu-lhe: Senhor, «Quererás tu perder o justo com o ímpio?» [Génesis, 18, 23]. Prometei-me, se encontrarmos cinquenta justos na cidade, que, por amor deles, os poupareis, mais os seus habitantes. O Senhor anuiu, mas Abraão, varão justo e bom conhecedor dos homens, convenceu, sem o enfadar, o seu deus a baixar o número para dez: está bem, Abraão, se houver dez justos, eu perdoarei a toda a cidade por amor deles. Mas nem dez justos encontraram. Então, o futuro deus de Israel, mandou dois anjos a casa do justo Lot, que lhe ordenaram que, o mais cedo possível, saísse, mais a sua mulher e duas filhas virgens, da cidade, para não perecerem na maldade dela. E assim aconteceu: entrava, seguro, Lot, mais a sua família, na cidade de Segor, pela hora da descida do manto do crepúsculo sobre a Terra, quando, vindos do céu, começou a chover enxofre e fogo sobre Sodoma e Gomorra. Mas Segor, como todas as utopias, foi refúgio breve. Hoje, chovem, pelos mesmo lugares, mísseis inteligentes, vindos do mar. A história das Babilónias confunde-se com a história dos deuses: emigraram para Ocidente.

Com o critério do deus de Abraão, quantas cidades sobreviveriam, hoje? E, se houvesse um deus, que dissesse a cada cidade: apresentai-me dez justos e eu a pouparei, quantos Lots apareceriam? Os ímpios subverteram os deuses e em vez de serem eles a enviar os seus anjos a Lot, salvando-o da destruição da cidade, são os ímpios dos bons princípios, das boas maneiras, das influências, que expulsam o justo da vida e a sodomizam. Só os justos são injustos na exigência que fazem aos deuses: que, por amor deles, poupem os injustos. O justo é o mais temido pelos ímpios, porque conhece e combate a “tumografia” da cidade.

Não há Segor para onde ir, porque, ao contrário da mulher de Lot, não olharíamos para trás.